Para quem que, de alguma forma, está envolvido com o mundo do surfing, é certo e sabido que Mike Stewart e Kelly Slater, reconhecidos por G.O.A.T. (Greatest Of All Time) do Bodyboard e do Surf, acabam por ser a grande inspiração de uma grande parcela da comunidade.

E isto porque, apesar dos seus 58 e 49 anos, respetivamente, quer o tio Mike como o “carequinha alien” continuam a competir ao mais alto nível nas disciplinas que representam. Em desportos onde se querem – e se revelam – atletas cada vez mais jovens a cada temporada, saber que Mike e Kelly ainda têm hipótese de fazer estragos entre os melhores do mundo, acaba por funcionar como uma espécie de tónico para toda uma geração.

É francamente motivador não só para a geração mais velha que cresceu a observar os seus desempenhos de perto, mas também para a geração mais recente que fica com a prova comprovada de que as carreiras não têm necessariamente que terminar aos 30 anos.

Adaptando ao feudo português, por cá temos Manuel Centeno, um dos nossos melhores exemplos de sempre no que respeita a resiliência e foco, mas também um perfeito desmancha-prazeres no que a corridas ao título nacional diz respeito.

No fim de semana, em ondas portentosas e desafiantes de 1,5 a 3 metros, na internacional arena dos Supertubos, Centeno alcançou o seu nono título nacional open*, 21 anos depois de ter conseguido a sua primeira conquista e cinco anos depois da última. E fê-lo de forma bem convincente, provando ser um dos atletas mais bem preparados fisicamente e um dos mais astutos também na gestão da tática e da pressão natural que uma corrida a um título nacional implica.

Para mim o seu desempenho foi tipo um déjà vu, fez-me recordar um final de circuito realizado em Sagres a meio da década 2000. Na altura, à partida para a derradeira etapa, Manuel Centeno estava em nono lugar do ranking e tinha pela frente oito adversários (sim, oito!) com clara vantagem nas contas. Todavia, matematicamente, apesar da intrincada circunstância de cenários, ele tinha uma ténue chance de alcançar o título.

Ainda assim, fase após fase, preseverou, batalhou, viu os seus oponentes caírem e acabou mesmo por vencer a prova contra todas as probabilidades – vencendo também o circuito. O impossível aconteceu e desde então o Manuel têm sido uma referência do bodyboard nacional.

“(…) por cá temos Manuel Centeno, um dos nossos melhores exemplos no que respeita a resiliência e foco”

Aos 41 anos está em perfeita harmonia. Sabe que a vitória já não é sobre encher o ego, mas prende-se mais com o exemplo a dar às gerações vindouras. Uma mostra de experiência inequívoca. Obviamente, o desafio de superação pessoal está sempre lá, mas passou a haver um sentido de responsabilidade que fala mais alto e que faz toda a diferença. E quando há boa intenção, as coisas acontecem naturalmente.

Uma última nota para o primeiro título nacional de Teresa Padrela que veio quebrar a hegemonia de Joana Schenker (7x campeã). A Teresa, que foi formada por outra grande campeã, a Catarina Sousa, é o espelho de uma nova geração de bodyboarders que vem com tudo, revelando muita atitute e sede de vencer.

Palavra de apreço também para Mariana Silva e Filipa Broeiro. A atual campeã sub-18 feminino, da escola figueirense, foi muito competente e a surfar assim facilmente deixa adivinhar mais bons resultados no futuro. Já a Filipa, pelo segundo ano consecutivo, com muito mérito, chega à última etapa com hipóteses reais de se tornar campeã. Ainda não foi desta, mas lá diz o ditado: “Água mole em pedra dura tanto bate até que…”


* MC tem títulos Open conquistados em 2000, 2006, 2007, 2009, 2011, 2012, 2014, 2016 e 2021.
FOTOGRAFIA: @HELIO_ANTONIO / @CNBBCA2021