Hugo Matos, 35 anos, é um dos filhos da Praia da Barra, Aveiro. Bodyboarder há mais de vinte anos, é agora chegada a hora de nos falar de temas vários, como o estado do bodyboard, a produção de vídeos e até uma das suas grandes paixões, a neve e os Alpes suíços. Cavaqueira para conferir aqui e agora.
Fala-nos um pouco do que tens feito nos últimos anos?
A minha paixão pelo Bodyboard revelou-se muito cedo. Tinha 14 anos quando, numa bela tarde a meio da semana, saí do meu treino semanal de Karate para receber a minha primeira prancha de Bodyboard a sério. Era uma Madrid, verde fluorescente, com slick skin e tudo! Fiquei sem palavras, sem qualquer reacão… Já tinha experimentado a sensação de andar nas ondas, mas apenas numa Suntalon. Escusado será dizer que no dia seguinte estava no mar gelado da Praia da Barra a experimentar e a deliciar-me com a velocidade e controlo do novo “veículo”.
Com o passar do tempo, evoluí e lancei-me nas competições regionais, nacionais e em alguns eventos europeus que por cá passaram (em Aveiro), mas sem grande sucesso. Sou atleta federado na Associação de Surf de Aveiro, esta que tanto me mostrou e fez evoluir ao longo destes anos todos, não só pelo fator aprendizagem, mas também pela camaradagem e amizade genuína que por lá encontrei.
Sem as competições de Bodyboard, em grande parte pelo fraco apoio das marcas envolvidas, tenho feito como outros tantos que estão espalhados pelo país, mantenho o feeling do desporto e a paixão em desbravar slabs, percorrer longos e secos tubos ou acertar grandes aéreos. Isso sim é o verdadeiro Bodyboard. Uma vez Bodyboarder, para sempre bodyboarder… ou até que o corpo diga o contrário!
Neste momento trabalho em audiovisual na minha empresa, a HandMade Produções, que oferece todo o tipo de cobertura de eventos e serviços audiovisuais. É um projeto individual a dar cartas dentro e fora de Portugal. Também trabalho como operador informático do sistema de pontuação dos juízes e operador de câmara. É a empresa Refresh que faculta estes dois tipos de serviços. Portanto, sou freelancer de fotografia, comentador de provas, instrutor de Surf e Bodyboard e ainda DJ em pequenas festas.
E como se processa a ida para a Suíça? O que motivou a tua saída do país?
Desde há 13 anos que vou para os Alpes suíços, sempre no inverno, para o meio da montanha em Davos, trabalhar e aproveitar a neve no Snowboard. Essa decisão aconteceu quando tinha 21 anos e queria mais da vida e do mundo. Não queria passar parte da minha vida a estudar, então “virei” emigrante em part time. Assim, passo metade do ano em Portugal ou a viajar, por sítios como Marrocos, Costa Rica, Brasil, Indonésia e Europa; e a outra metade a “derreter” neve nos Alpes.
O facto de ter emigrado, ainda que no regime de part time, possibilitou-me outro tipo de condições monetárias e sociais, contato com mentes mais abertas numa mistura cultural diferente e versátil. E foi aí que o Snowboard surgiu e se tornou noutra paixão… Foi o meu escape para o absentismo do Bodyboard.
Como foram esses tempos fora de casa?
Inicialmente foi um impacto grande e uma aventura ter de sair do país à procura de novas oportunidades, mas com as pessoas certas do meu lado facilmente encontrei uma nova casa onde fui acolhido como um irmão. Com o passar do tempo senti a falta da família, dos amigos e do mar, mas essa é uma sensação momentânea e o tempo passa num instante.
Estás de regresso para ficar?
Regressar a Portugal é uma questão que me incomoda há já uns três anos. Neste momento estou completamente dividido, talvez à espera que a própria situação financeira evolua e realmente se comece a notar uma progressão, seriedade e mudança no nosso governo. Deixar Portugal de vez é uma realidade, mas ainda não sei. Esta vida dividida cansa, mas compensa no final de tudo: dizes adeus à monotonia, conheces montes de pessoal porreiro e fazes amizades duradoiras. Há quem diga que viajar e conhecer o mundo é a melhor universidade da vida e eu não só acredito nisso como apoio profundamente. A verdade é que não trocava estes 13 anos de viagens e experiências por um canudo.
Como ex-competidor, como vês o estado do bodyboard?
A meu ver, o nosso Bodyboard está sempre em constante evolução. Uma evolução lenta sim, não nos atletas, mas por parte das empresas e marcas que teimam em não apoiar ou dar o devido retorno aos atletas e ao desporto. Contudo, sempre em evolução. Desde que me lembro que se fazem competições em Portugal, existe alguma vontade e meios para se fazerem eventos à seria em Portugal, temos ondas até dizer chega, slabs de classe mundial e condições naturais brutais. É preciso continuar a apostar e, principalmente, fazer com que aconteça.
E como está a situação por Aveiro?
Na zona de Aveiro existe vontade e querer por parte da Associação de Surf de Aveiro, mas eles não podem fazer milagres quando não há grandes apoios das marcas. Infelizmente, a longo prazo, esta situação sem apoios vai acabar por se tornar numa bola de neve que acabará por fazer com que cada vez mais atletas deixem de competir, mesmo para aqueles que estão a sair das escolas ou a quererem simplesmente iniciar-se na competição.
Penso que o cenário do Bodyboard lá por fora é parecido. Por esse mundo fora existem atletas cada vez mais novos a “partir a loiça” e contamos também com uma panóplia de competidores como o Mike Stewart, Guilherme Tâmega, entre muitos outros, que estão a fazer com que o próprio desporto evolua. Acredito que o Bodyboard, em termos gerais, está bem de saúde. Obviamente, podíamos estar com mais e melhores apoios das grandes marcas, mas as coisas são como são…
Que projetos para os próximos tempos?
Os projectos futuros passam, para já, por me manter “dividido”, ou seja, na mesma situação entre a Suíça e Portugal. Vou continuar a aproveitar o melhor dos dois países. Gostava de fazer outra viagem, visto que as últimas foram feitas em 2009/2010. Talvez México, Filipinas ou continuar a conhecer o arquipélago indonésio que tantas e tantas ilhas e ondas solitárias tem para descobrir.
Uma última mensagem…?
Vão atrás dos vossos sonhos, pois ter um curso não é tudo na vida. “Mais vale um jovem pobre e sábio do que um rei ancião e insensato.” (Eclesiastes 4, Bíblia)
Fotografia: André Neto & Amauri Di Maia